Retratos do Autismo no Brasil em 2023

O estudo “Retratos do Autismo no Brasil em 2023”, realizado em setembro desde ano por duas startups – Genial Care (…) e Tismoo.me (…) – teve como principal objetivo colher dados inéditos e relevantes sobre as pessoas autistas e suas famílias, considerando uma estimativa mais atual de 6 milhões de pessoas com TEA no Brasil (feita com base em dados do CDC, que dizem que 1 em cada 36 pessoas está no espectro do autismo nos Estados Unidos).
O levantamento contou com mais de 2.200 respondentes de todo o Brasil – cuidadores e pessoas autistas, e também autistas cuidadores – estes últimos representam 24,2% dos entrevistados dentro da amostra de autistas. A maioria das pessoas respondentes possui entre 35 e 44 anos (42%).
O autismo é uma condição que está presente na vida de milhões de pessoas em todo o mundo, e no Brasil não é diferente. A discussão sobre a prevalência do autismo no Brasil tem sido um tema de longa data, especialmente considerando que as estimativas mais recentes apontam para a presença de 2 milhões de pessoas com autismo no país – número que deve ser atualizado pelo último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que incluiu, pela primeira vez, o autismo em suas estatísticas. A intenção é mapear quantas pessoas tem o diagnóstico do transtorno, mas ainda não saberemos quantas podem tê-lo. Os novos números estão previstos para serem divulgados somente em 2024.
“É fundamental destacar que o aumento no número de pessoas autistas se deve em grande parte ao progresso da ciência, que se empenha em estudar e compreender esse transtorno. Além disso, graças aos avanços científicos, as informações relacionados ao transtorno do espectro autista (TEA) tornaram=se mais acessíveis”, destaca o fundador e CEO da Genial Care, Kenny Laplante.
O que o estudo diz sobre as pessoas autistas
O estudo “Retratos do Autismo no Brasil em 2023” teve uma amostra representativa de 13,8% de pessoas autistas, número significativo quando se observa que, segundo a ONU, 1% da população mundial está no espectro do autismo (considerando números bem conservadores, de mais de uma década atrás).
Das pessoas respondentes, 65% se identificam como gênero feminino, maioria com faixa etária entre 25 e 34 anos (33%). “Esses dados são bem relevantes, pois a presença majoritária de mulheres entre as respondentes do estudo depõe contra o mito de que a prevalência do TEA é maior em homens (o que já vem sendo, inclusive, estudado por especialistas). Além disso, ter pessoas autistas que também são cuidadores reforça a questão entre genética e TEA, uma vez que fatores genéticos tem um papel fundamental no desenvolvimento do transtorno”, afirma Laplante.
Sobre as condições de saúde mental e física e do dia a dia das pessoas autistas, 49,33% afirmam que possuem alguma doença crônica ou secundária que foi identificada junto ao diagnóstico de TEA, e 50% afirmam não ter acesso a recursos e suportes adequados para as suas necessidades. “Segundo a literatura científica, a saúde da pessoa autista é mais vulnerável que a população em geral. E estou falando de doenças comuns como questões gastrointestinais (8,4%), doenças respiratórias (3,6%), hipovitaminoses (3,5%), obesidade (2,95%) e anemia (2,6%), por exemplo, que aparecem nessa ordem entre as mais prevalentes em autistas. Esta pesquisa confirma essa informação, mostrando que cuidar da saúde é um desafio para todo o espectro”, explica Francisco Paiva Jr., cofundador e CEO da Tismoo.me.
Outro aspecto importante da pesquisa é a respeito do suicídio entre pessoas autistas. “Pesquisas científicas apontam para um número 8 vezes maior na tentativa de suicídio feita por autistas em relação à população em geral. Nesta nossa pesquisa, o número foi alarmante: 7,26% dos autistas já atentaram contra a própria vida. E quando perguntado se um familiar já tentou suicídio, o número é ainda maior: de 17,29%. É, sem dúvida, uma questão de saúde pública, que deve ser tratada por governos e sociedade com atenção e urgência!”, argumenta Paiva, que está treinando uma inteligência artificial da Tismoo.me para reconhecer ideação suicida em pessoas autistas.
A maioria (87,50%) afirmou receber algum apoio familiar ou social para lidar com os desafios do autismo. “O apoio familiar ou social desempenha um papel crucial na qualidade de vida das pessoas com autismo, ajudando-as a superar desafios, desenvolver habilidades e alcançar seus pleno potencial. É importante reconhecer que o autismo é uma parte da identidade desses indivíduos e que o apoio e a compreensão da família e da comunidade desempenham papel fundamental na promoção do bem-estar e do desenvolvimento”, explica o fundador da Genial Care.
Em relação à inclusão e presença no mercado de trabalho, estes são os números apresentados pelo estudo: 46,50% trabalham em período integral, e 27,71% não tem atividades formais no momento. Kenny ressalta que “a inclusão de pessoas autistas no mercado de trabalho não é apenas uma questão de responsabilidade social, mas também traz benefícios significativos tanto para os indivíduos autistas quanto para as empresas, ajudando a construir um ambiente de trabalho mais diversificado, inclusivo e produtivo”.
Principais dificuldades dos cuidadores no Brasil
“Em comparação com dados apresentados no estudo anterior da Genial Care, Cuidando de quem cuida, as dificuldades dos cuidadores ainda permanecem praticamente as mesmas”, ressalta Laplante.
Entre as três principais dificuldades citadas pelos cuidadores estão: sentir segurança quando pensa no futuro a longo prazo da criança (79%), dificuldades financeiras para arcar com os custos do tratamento (73%) e encontrar tempo para descanso e para cuidar de si mesmo (68%).
“Esses dados mostram o quanto há sobrecarga na rotina das pessoas cuidadoras, e o quanto é essencial que haja um sistema de apoio abrangente, que inclua acesso a serviços de saúde mental, programas de suporte para cuidadores, redes de apoio e educação pública sobre o autismo. Além disso, a conscientização e o entendimento da sociedade sobre as necessidades das crianças autistas são fundamentais para reduzir o estigma e o isolamento social que os cuidadores enfrentam”, pontua o fundador da Genial Care.
O que o estudo diz sobre os cuidadores e familiares
O estudo mostrou que 64% dos cuidadores tem entre 25 e 44 anos, e 65,61% se identificam com o gênero feminino. Sobre o gênero, dados encontrados no estudo anterior da Genial Care, Cuidado de quem cuida: um panorama sobre as famílias e o autismo no Brasil, demonstram que 86% das pessoas cuidadoras de crianças com TEA são as próprias mães.
62,99% dos cuidadores afirmam possuir acesso a serviços que promovam a saúde mental, 63,04% afirmaram receber apoio para lidar com desafios do autismo. 40,35% destacam que os familiares são a maior fonte de apoio nos dois sentidos.
Importante destacar que a realidade em muitas partes do país, principalmente em locais de menor renda, pode ser diferente. Isso ocorre por conta do “viés” da pesquisa, que, por sua característica de participação espontânea (portanto não foi a campo), dependia de acesso à internet e da iniciativa de cada um ir online respondê-la.
FONTE: Revista Autismo. Ano X – Nº 23 – DEZ/JAN/FEV 2024.